LEMBREI-ME DO ANTÓNIO SETAS

O Reginaldo Silva (um dos nossos) escreveu ontem que “da primeira geração da nossa sempre ameaçada liberdade de imprensa, o Folha-8 é o único que resiste nas bancas e em formato físico/papel”. Foi então que me lembrei de ti, António Setas.

Por Orlando Castro

Olhei a chuva amarga que batia /tão felina quanto agre e agreste / nas vidraças do meu coração. / Fiquei sem saber se era pesadelo / ou apenas a saudade de uma dor / que fez da oração só um abafo.

Olhei a penumbra que vinha do sul
como se com ela viessem notícias
da minha banda, da outra banda.
Fiquei sem saber se a saudade vive
ou se apenas é miragem africana
num coração que baloiça ao vento.
Olhei a madrugada que sonolenta
dormia aos pés da noite sem luar,
como se fosse um canto nostálgico.
Fiquei sem saber se aquele sabor
a loengos nas esquinas da alma
era mais do que a noite esquecida.
Olhei o dia que não nascia como devia
à procura de uma razão para amanhã,
mesmo que ténue no meu horizonte.
Fiquei sem saber porque não cantou
o catuitui que todos os dias poisava
nos galhos partidos da minha alma.

E ele não cantou porque, em Fevereiro de 2020, tinha partido o António Setas. E com ele partiu também o catuitui. E não mais voltará. Estamos juntos, Companheiro.

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